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Operação Carbono Oculto: entenda o esquema bilionário do PCC no setor de combustíveis

A maior ofensiva já registrada no Brasil contra a infiltração do crime organizado na economia formal foi deflagrada nesta quinta-feira (28). Batizada de Carbono Oculto, a operação mobiliza 1.400 agentes públicos em dez estados para desarticular um sofisticado esquema de fraudes, lavagem de dinheiro e sonegação tributária comandado pelo Primeiro Comando da Capital (PCC).

A força-tarefa é formada por Receita Federal, Ministério Público (federal e estaduais), Polícia Federal, polícias civis e militares, Agência Nacional do Petróleo (ANP), secretarias de fazenda e procuradorias estaduais.

Veja a seguir o que a megaoperação revelou e o que se sabe até agora sobre os desdobramentos do caso.

O que revelou a investigação

O PCC teria criado uma estrutura empresarial e financeira paralela, infiltrando-se em toda a cadeia produtiva de combustíveis e no mercado financeiro formal, principalmente via fintechs e fundos de investimento.

“Há muito tempo, nós estamos acompanhando um fenômeno que é a migração da criminalidade organizada, da ilegalidade para a legalidade”, afirmou o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, em entrevista coletiva na manhã desta quinta.

A operação aponta para uma atuação multifacetada da facção:

  • Controle de ao menos 40 fundos de investimento, com patrimônio superior a R$ 30 bilhões;
  • Financiamento de quatro usinas produtoras de álcool, um terminal portuário e 1.600 caminhões de transporte de combustíveis;
  • Aquisição de mais de 100 imóveis, incluindo seis fazendas no interior de São Paulo (avaliadas em R$ 31 milhões) e uma residência em Trancoso (BA) comprada por R$ 13 milhões;
  • Importação irregular de metanol, nafta e diesel, usados na adulteração de combustíveis e para fraudes fiscais de R$ 7,6 bilhões;
  • Uso de fintechs e maquininhas para movimentar valores sem rastreamento, inclusive em postos de fachada e padarias.

Finanças do crime: fundos em cascata e fintechs com R$ 46 bi

A Receita Federal identificou uma rede de fundos multimercado e imobiliários fechaos, com estrutura em cascata, com apenas um cotista, que é outro fundo, dificultando a identificação dos beneficiários finais e a origem dos recursos.

Esses fundos, controlados por operadores infiltrados na Avenida Faria Lima, foram utilizados para:

  • Comprar ativos físicos (imóveis, frotas, refinarias);
  • Movimentar recursos ilícitos no sistema financeiro tradicional;
  • Blindar patrimônio obtido com atividades criminosas, inclusive tráfico de drogas.

A principal instituição de pagamento investigada, que funcionava como um banco paralelo, teria movimentado R$ 46 bilhões em valores não rastreáveis nos últimos anos. Essas empresas também financiaram importadoras, que compravam combustíveis no exterior para uso fraudulento no Brasil.

A Justiça ordenou o sequestro de todos os recursos dos fundos identificados como tendo envolvimento no crime.

Postos como lavanderia: 1.000 alvos e R$ 52 bilhões

Segundo a Receita, mais de 1.000 postos de combustíveis foram usados para lavar dinheiro, com movimentações de R$ 52 bilhões entre 2020 e 2024, mas com recolhimento de tributos considerado insignificante.

Cerca de 140 desses postos não registraram nenhuma operação real nesse período, mas receberam mais de R$ 2 bilhões em notas fiscais, possivelmente em aquisições simuladas para encobrir repasses a distribuidoras controladas pela organização.

Esses estabelecimentos funcionavam como “pontos de entrada” do dinheiro, captando recursos em espécie ou por maquininhas e os redirecionando às estruturas financeiras da facção.

Empresas envolvidas

A força-tarefa investiga mais de 350 alvos, entre empresas de diversos setores. Destacam-se:

  • Fintechs e instituições de pagamento: BK Bank, Bankrow;
  • Gestoras e DTVMs: Reag, Trustee, Altinvest, Banvox, Libertas, Actual, Ello;
  • Distribuidoras de combustíveis: Aster, Copape, Duvale, Arka, Rodopetro, Rede Sol Fuel, Port Brazil, entre outras;
  • Usinas: Carolo, Virgolino de Oliveira, Itajobi, Furlan, Rio Pardo, Comanche, Goiás Bioenergia;
  • Empresas de transporte e logística: G8 Log, TLOG, Rio Log, Liquipar.

Personagens centrais

As investigações apontam para cinco núcleos organizacionais centrais. Entre os principais nomes estão os empresários Roberto Augusto Leme da Silva (Beto Loco) e Mohamad Hussein Mourad, ligados às empresas Aster e Copape, e ao Grupo Manguinhos (ex-Refit), do empresário Ricardo Magro, ex-advogado do ex-deputado Eduardo Cunha.

Mesmo após a cassação de suas licenças pela ANP, essas empresas continuaram operando por meio de novas distribuidoras, empresas interpostas e parcerias com usinas, muitas vezes em nome de laranjas ou operadores condenados por tráfico internacional.

Reação do mercado: REAG3 desaba e distribuidoras sobem

A deflagração da operação teve impacto imediato na Bolsa. As ações da Reag Investimentos (REAG3), uma das gestoras investigadas, despencavam 17,29% às 10h45, antes de entrarem em leilão.

A empresa afirmou, em fato relevante enviado à CVM, que colabora com as autoridades e que o caso trata-se de “procedimento investigativo em curso”. A Reag se apresenta como a maior gestora independente do país, com R$ 299 bilhões sob gestão, e também é conhecida por deter os naming rights do cinema Belas Artes, em São Paulo.

Enquanto isso, ações de distribuidoras, como Raízen (RAIZ4, Ultrapar (UGPA3) e Vibra (VBBR3) disparavam, com analistas apontando que a operação ajuda a mitigar a informalidade do setor de combustíveis, vista como um dos principais obstáculos de crescimento para as grandes companhias.

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