Aos 87 anos, Giorgio Armani segue batendo ponto no escritório todos os dias. E não é dando uma passadinha. Armani é o diretor criativo e o CEO de seu império, a palavra final de todas as decisões de uma das únicas empresas de moda de porte multibilionário a seguir independente, e que ele comanda à mão de ferro. Império que não é sinônimo “somente” de roupas e acessórios (com direito a 500 lojas pelo mundo), mas de todo um estilo de vida: seu conglomerado inclui hotéis, bares, restaurantes, linha de décor e de beleza, uma livraria. Um universo todo em nuances de cinza, taupes, marinhos e “greiges” (o mix entre grey e beige, cinza e bege, inventado por ele). Tudo elegante, funcional, discreto, eterno. Onde nada está ali por acaso, a forma existe em favor da função e a elegância não passa apenas pelas roupas, mas também pela maneira de lidar com a vida e com o mundo.
Look da coleção de alta-costura para o inverno 2021, clicado em Dubai, onde foram redesfilados no evento One Night Only
Stefano Guindani
E, na maximalista Dubai, a estética de Armani se materializa de maneira completa. No prédio mais alto do mundo, o Burj Khalifa, o estilista mantém um de seus dois hotéis (o outro está localizado em Milão), um restaurante e um nightclub, próximo também a uma das maiores lojas da marca Giorgio Armani, no Dubai Mall. Em outubro, a cidade foi escolhida para a primeira edição do evento One Night Only pós-pandemia, os desfiles itinerantes de Armani que já passaram por Londres (2006), Tóquio (2007), Pequim (2012), Roma e Nova York (ambos em 2013) e Paris (2014). “Escolhi Dubai porque queria comemorar os dez anos do meu hotel. Foi o primeiro que criei e, como tal, sempre terá um lugar especial nas minhas afeições. Foi a realização de um sonho que há muito acalantava: ver a minha estética e filosofia de design ganhar vida”, conta em entrevista à Vogue.
Ao longo das últimas quatro décadas, os Emirados Árabes foram fonte de inspiração para as criações de Giorgio Armani, como pode ser visto nas coleções de verão 1994
Peter Lindbergh
Em paralelo à Expo 2020 que acontece até março de 2022 na cidade, Armani reuniu 400 convidados (entre clientes locais, editores de títulos pelo mundo e celebridades como Sharon Stone) aos pés do Burj Khalifa para reapresentar seus desfiles de prêt-à-porter para o verão 2022 (originalmente exibido em Milão em setembro) e alta-costura para o inverno 2021 (em julho em Paris). Em uma noite que terminou com Chris Martin cantando descalço e à capela, para a qual o sr. Armani chegou com quatro dias de antecedência para cuidar pessoalmente das provas de roupa das modelos, ambas coleções levavam uma mensagem de esperança e otimismo. “Depois do estresse dos últimos tempos, são looks repletos de positividade fácil – confortáveis e simples de vestir”, diz ele, que, apostou em materiais leves e “que acariciam o corpo com fluidez” no prêt-à-porter e em tecidos brilhantes de aparência quase líquida na alta-costura. “Usados para celebrar a ideia de emergir mais uma vez no mundo dos eventos sociais.”
Ao longo das últimas quatro décadas, os Emirados Árabes foram fonte de inspiração para as criações de Giorgio Armani, como pode ser visto nas coleções de verão 1994
Peter Lindbergh
O uso da palavra “reemergir” tem um simbolismo ainda mais especial vindo de Giorgio Armani. Em fevereiro de 2020, durante a semana de moda de Milão, quando os primeiros casos de coronavírus surgiam na Itália, o estilista foi o primeiro a cancelar um desfile (que acabou acontecendo sem plateia e transmitido digitalmente), em uma atitude considerada prematura por alguns na época, visto que as apresentações em Paris ainda seguiram normalmente por dez dias. No início da quarentena, também puxou uma discussão sobre o atual ritmo da indústria, ao pedir por uma desaceleração em carta aberta ao WWD e repreender a indústria do luxo por entrar na velocidade do mercado fast fashion. “O ciclo de novos produtos substituindo os ‘antigos’ ficou cada vez mais rápido, e estou simplesmente pedindo que diminuamos o ritmo. Da nossa parte como marcas, o que podemos fazer são roupas que realmente duram mais, porque são feitas de materiais melhores e construídas de maneira superior. Mas também projetado para ser estiloso ao invés de moderno, para parecer relevante por anos ao invés de meses.”
Ao longo das últimas quatro décadas, os Emirados Árabes foram fonte de inspiração para as criações de Giorgio Armani, como pode ser visto nas coleções de verão 1994
Peter Lindbergh
Se Giorgio Armani hoje é reconhecido como um sinônimo de um guarda-roupa superelegante por qualquer pessoa do mundo, mesmo que não seja iniciada na indústria fashion, o grande público muitas vezes desconhece a revolução pela qual ele foi responsável na moda. Na década de 80, o estilista formado em medicina, que começou a própria marca aos 41 anos, protagonizou uma reforma à la Coco Chanel no guarda-roupa masculino, ao reinventar a maneira como a alfaiataria era feita. Armani dispensou ombreiras, entretelas e toda a rigidez de outrora e apostou em cortes mais suaves: a raiz do conforto visto na moda hoje reside na desformalização do guarda-roupa iniciada por Armani. Mas ele comandou tal descontrução com tanta elegância e perfeição que você nem percebeu o quão revolucionário era seu conceito.
Ao longo das últimas quatro décadas, os Emirados Árabes foram fonte de inspiração para as criações de Giorgio Armani, como pode ser visto nas coleções de verão 1994
Peter Lindbergh
“O trabalho me mantém energizado”
O que o sr. Armani pensa sobre sucesso, futuro e aposentadoria
Ao longo das últimas quatro décadas, os Emirados Árabes foram fonte de inspiração para as criações de Giorgio Armani, como pode ser visto nas coleções de verão 1994
Peter Lindbergh
Uma marca independente
“Nunca um fardo, sempre uma liberdade. Significa que posso criar em meus próprios termos e explorar ideias completamente livre de qualquer exigência de responder a outra pessoa.
O benefício disso não tem preço, no que me diz respeito. É por isso que, embora tenha sido abordado muitas vezes, sempre rejeitei ofertas de que minha empresa fosse comprada.”
Ao longo das últimas quatro décadas, os Emirados Árabes foram fonte de inspiração para as criações de Giorgio Armani, como pode ser visto nas coleções de verão 1989
Peter Lindbergh, Aldo Fallai e Divulgação
Legado para o futuro
“Espero ser lembrado por meu trabalho e, em particular, por minha promoção de um ideal de estilo atemporal em vez de moda movida a tendências. Gostaria que as pessoas entendessem os grandes avanços que fiz na desconstrução de roupas de alfaiataria nos anos 70 e 80, o que, acredito, contribuiu muito à expectativa de hoje de que as roupas devem ser confortáveis, bem como ter uma boa aparência. Mas, acima de tudo, gostaria de ser lembrado como alguém que sempre trabalhou muito e tentou se desafiar em nome da inovação.”
Ao longo das últimas quatro décadas, os Emirados Árabes foram fonte de inspiração para as criações de Giorgio Armani, como pode ser visto nas coleções de verão 2014
Peter Lindbergh, Aldo Fallai e Divulgação
O papel da moda
“A moda deve servir ao usuário. Embora nasça da imaginação de um designer, ela só se torna moda quando é comprada e usada por um cliente. Caso contrário, é simplesmente uma indulgência. Se for criado principalmente para passarela, para editoriais de revistas ou para ser popular nas redes sociais, e não para usar na vida real, então pode ser interessante – pode até ter mérito artístico – mas não é verdadeiramente moda.”
Ao longo das últimas quatro décadas, os Emirados Árabes foram fonte de inspiração para as criações de Giorgio Armani, como pode ser visto nas coleções de verão 2011
Peter Lindbergh, Aldo Fallai e Divulgação
Significado de sucesso
“Para mim, é simplesmente poder trabalhar, ser capaz de concretizar minhas ideias, criar produtos bonitos que deixem as pessoas felizes, e administrar uma empresa que traga um senso de propósito e satisfação para aqueles que nela trabalham.”
Elegância
“Foi minha mãe quem me deu o melhor conselho. Ela costumava dizer que se você deseja criar beleza, faça apenas o que for necessário e nada mais. Elegância é o essencial. No vestido, no design e no comportamento.”
Aposentadoria
“Não desejo diminuir o ritmo no que diz respeito ao meu trabalho. O trabalho é o que me mantém energizado. Tenho sorte, pois sou curioso e movido pelo desejo de me desafiar. Sou tão apaixonado pelo processo criativo agora quanto era quando comecei como designer.”