O cenário está favorável para as stablecoins como alternativa para investir em moeda forte e enviar dinheiro ao exterior. Primeiro, por causa do aumento do IOF nesta semana, determinado pelo ministro Alexandre Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que beneficia essas criptos, já que podem ser usadas para a mesma finalidade – e não estão sujeitas ao imposto. Em segundo lugar, devido à primeira legislação para regular essas moedas digitais nos Estados Unidos, aprovada ontem pelo Congresso americano, algo visto como um marco para o setor.
As stablecoins, importante explicar, são criptomoedas com lastro atrelado a algum ativo do mercado, como dólar, real ou euro, na proporção de 1:1. Ou seja, cada unidade de uma stablecoin equivale, em teoria, a uma unidade da moeda ou título a que ela está vinculada. Elas têm uma proposta diferente das criptomoedas tradicionais, como Bitcoin (BTC) e Ethereum (ETH). As duas maiores stablecoins do mercado são a Tether (USDT) e a USD Coin (USDC), ambas ligadas à moeda americana. Por isso, são chamadas de “cripto dólar”.
Stablecoins e o câmbio
A decisão de Moraes eleva a alíquota de IOF para remessas ao exterior destinadas a gastos pessoais de 1,1% para 3,5%, e de 0,38% para 1,1% no caso de remessas para investimentos. Esse aumento favorece as stablecoins porque elas podem ser usadas para enviar dinheiro para fora e não estão sujeitas à cobrança de IOF, já que não são consideradas ferramenta de câmbio pela legislação brasileira.
“Hoje, o entendimento predominante é que o uso de stablecoins não configura, por si só, uma operação de câmbio, pois não há entrega de moeda estrangeira por instituição autorizada pelo Banco Central. A operação se dá entre criptoativos, fora da estrutura oficial do mercado de câmbio”, explicou Lorena Botelho, sócia do escritório Urbano Vitalino Advogados e especialista em Direito da Tecnologia e Inovação.
Para enviar dinheiro para o exterior com essas criptos, bastar comprar por meio de uma corretora que atue no Brasil e transferir diretamente para a carteira digital do destinatário no exterior, informando endereço o cripto da pessoa. Em caso de uso próprio durante uma viagem, basta mandar os ativos para uma carteira digital pessoal, como Trust Wallet ou MetaMask. No destino, as stablecoins podem ser usadas em compras e até sacadas em moeda local por meio de caixas eletrônicos especializados.
No entanto, esse uso de stablecoins para mandar dinheiro para fora é um ponto de discussão no Brasil. No final do ano passado, o Banco Central (BC) abriu uma consulta pública para levantar opiniões sobre uma proposta de regulamentação da inclusão de serviços de ativos virtuais no mercado de câmbio. “A intenção, portanto, é rever o entendimento atual”, disse Lorena.
Negociações com “cripto dólar”
Enquanto se debate a possibilidade de mudança no entendimento jurídico, os brasileiros já parecem ter percebido a oportunidade.
Em junho, as negociações com USDT – que, aliás, é a cripto mais usada no Brasil, superando até mesmo o Bitcoin, segundo dados da Receita Federal – somaram R$ 9,63 bilhões, de acordo com levantamento da Biscoint Monitor, ferramenta da Bitybank. O volume representa um crescimento de 32% em relação a maio, quando foram negociados R$ 7,29 bilhões, e coincide com o anúncio do aumento do IOF, feito no final de maio.
“O aumento na movimentação mostra o fortalecimento das stablecoins como meio de troca e reserva de valor no Brasil, sobretudo em um contexto de maior uso para pagamentos e remessas”, disse a Bitybank em relatório.
Regulação cripto
Além da situação favorável no Brasil, as stablecoins também ganharam impulso nos Estados Unidos. Ontem, o Câmara americana aprovou a GENIUS Act, a primeira legislação federal voltada à regulamentação do setor. O projeto impõe supervisão federal ou estadual sobre tokens vinculados ao dólar que podem ser movimentados 24 horas por dia em diversas plataformas.
Segundo apoiadores, a medida pode desbloquear formas de pagamento mais rápidas e baratas – além de trazer legitimidade a um mercado de US$ 265 bilhões, que pode crescer para US$ 3,7 trilhões até 2030, de acordo com o Citigroup.
A legislação “oferece à indústria de stablecoins o grau de legitimidade que eles vinham buscando”, disse Eswar Prasad, pesquisador sênior do Brookings Institution, à Bloomberg. “E o bônus é que vem com o que eu considero uma regulamentação relativamente leve.”
Além da regulação das stablecoins, os parlamentares também aprovaram o Clarity Act, que estabelece diretrizes para o tratamento regulatório de criptomoedas e ativos digitais, e o Anti-CBDC Act, que trata de restrições ao desenvolvimento de moedas digitais emitidas por bancos centrais, as CBDCs.
“A aprovação desse pacote regulatório pelo Congresso dos Estados Unidos é um marco para o ecossistema cripto global. Os três projetos trazem diretrizes claras e segurança jurídica para um setor que, até então, operava sob forte incerteza regulatória”, falou Murilo Cortina, diretor de novos negócios da QR Asset Management, para o InfoMoney.
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