Por que o Pix incomoda tanto Donald Trump?

Na última semana, sem citar o nome do método de pagamentos, os Estados Unidos anunciaram uma investigação sobre “práticas comerciais desleais” do Brasil. De acordo com o documento, o Pix é uma ameaça à competitividade de empresas norte-americanas.

Para entender o motivo do incômodo de Donald Trump com o Pix, conversamos com Fred Amaral, CEO da Lerian, especialista em infraestrutura de pagamentos e empreendedor do setor financeiro.

O Pix ameaça a competitividade? 

O Escritório do Representante Comercial dos Estados Unidos (USTR) afirmou no dia 15 de julho que “o Brasil parece se envolver em uma série de práticas desleais com relação a serviços de pagamento eletrônico, incluindo, entre outras, a obtenção de vantagens em seus serviços de pagamento eletrônico desenvolvidos pelo governo”.


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Com essa descrição, o documento só poderia se referir ao Pix. O método de pagamento criado pelo Banco Central (BC) em 2020 “assusta” os Estados Unidos por colocar em xeque a soberania das empresas norte-americanas que lideram o mercado de transações financeiras no mundo: Visa e Mastercard

Em 2024, as duas empresas juntas tiveram um total de 61,56 bilhões de transações na América Latina, de acordo com a Nilson Report. Enquanto isso, o Pix, só no Brasil, atingiu 63 bilhões de transações.

De acordo com Fred Amaral, o Pix entrou na disputa deste mercado como se fosse uma “bandeira”, assim como Visa e Mastercard. Ou seja, o BC se torna um concorrente destas empresas, mas que tem maior poder de regulamentação. 

“Temos o cenário em que o regulador (Banco Central) se transformou num instituidor de arranjo de pagamento, se transformou numa ‘bandeira’, digamos assim. E, com o poder de regulador, ele obrigou as instituições financeiras do Brasil a aderirem esse arranjo”, explica Fred.

Depois de instituído pelo BC, tornou-se obrigatório para instituições financeiras e bancos com mais de 500 mil contas ativas oferecerem o Pix aos seus clientes. E, ao contrário das empresas privadas, o Pix não cobra nenhuma taxa de transação por transação entre pessoas físicas. 

“Esse é o poder do regulador, tentar criar mecanismos de regulação micro e macroeconômicos que beneficiem em última instância a população”, complementa Fred.

pix em celular
A partir de setembro, o BC liberará o Pix parcelado, que pode substituir as compras em cartão de crédito (Imagem: Fotografia/André Magalhães/Canaltech)

E o Pix, inegavelmente, caiu nas graças da população. De acordo com dados do BC de 2024, são mais de 170 milhões de usuários, que movimentaram R$ 26 trilhões no ano passado. 

A popularidade do método de pagamento não foi por acaso. Além do “timing” para lançamento, durante a pandemia, quando se evitava o contato físico, as chaves Pix são mais fáceis de utilizar do que todos os dados bancários necessários para uma transferência por TED, por exemplo. Mas, claro, a questão econômica facilitou sua popularização. 

“Ele (o Pix) levou o custo transacional de movimentação de dinheiro para quase zero, o que do ponto de vista micro e macroeconômico para população é incontestável, seja você um estabelecimento comercial ou uma pessoa física, é positivo para você”, completa o CEO da Lerian.

A forte concorrência do Pix com as bandeiras norte-americanas se deu, como resume Fred, por “talvez os Estados Unidos não estarem tão acostumados com um regulador que faz muito bem o seu papel”.

Vale lembrar também do caso com o WhatsApp Pay em 2020. O método de transação via app de mensagens utilizava bandeiras de Visa e Mastercard para transferências entre pessoas físicas, e foi bloqueado pelo BC pouco antes do lançamento do Pix. 

Em 2021 o recurso foi liberado, mas nunca se popularizou como o método de pagamento do BC. 

Influência do Pix 

Além do incômodo que os EUA têm de ver um dos maiores mercados consumidores do mundo, o Brasil, diminuindo a dependência de empresas estadunidenses, a influência do método de pagamento em outros países também pode ser combustível para as tensões comerciais entre os países. 

O BC tem conversas em andamento com Colômbia, Chile, Equador e Uruguai para a difusão do sistema brasileiro em outros países da América Latina. 

Além disso, turistas brasileiros já conseguem usar o Pix em diversos países, como no próprio EUA, por conta de uma parceria entre a Verifone e a PagBrasil.

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