Livros como decoração? Rafa Kalimann é zoada por compra, mas hábito é comum em livrarias


Livros como decoração? Rafa Kalimann é zoada por compra, mas hábito é comum em livrarias
“Viemos na livraria comprar livros decorativos para casa. Eu surto com esse rolê”, disse a ex-BBB Rafa Kalimann em uma sequência de stories no Instagram, publicada na semana passada. “São R$ 10 mil de livros. Nunca vi isso aqui na minha vida”, afirmou o cantor Nattanzinho em outro vídeo postado por ela. Pouco tempo depois, o casal se tornou alvo de piadas e críticas.
“Esse aqui não é um vídeo de justificativa, tá? Até porque ninguém tem que justificar aquilo que se gasta com o próprio dinheiro”, rebateu a ex-BBB em outro vídeo publicado na quinta (31), no qual ela ironicamente se justifica.
Rafa disse, então, que vários dos livros que eles compraram são de culinária. O intuito foi decorar a cozinha e aprender receitas — no meio da pilha, porém, havia “Francis Bacon: A beleza da carne”, catálogo artístico que nada tem a ver com gastronomia, o que gerou novas zoações nas redes.
Apesar dessa repercussão toda (e da bola fora com o pintor Francis Bacon), Rafa não está totalmente errada ao usar o termo “livro decorativo”. A maioria dos exemplares de culinária que ela mostrou é coffee table book, ou seja, um tipo de livro que tem forte apelo estético.
Rafa Kalimann mostra livros recém-comprados
Reprodução
Julgar o livro pela capa
Os coffee table books são livros grandões, geralmente postos em mesas de centro. Têm capas chamativas e conteúdos inspiracionais. São obras bastante visuais, com temáticas de fotografia, moda, culinária, viagem, arquitetura e por aí vai.
Esse tipo de livro faz sucesso não apenas em livrarias, mas também em lojas de móveis — ficam ali justamente para convencer o cliente a comprá-los como acessórios de decoração das mobílias.
Debora Medeiros é diretora comercial da Queen Books, distribuidora brasileira de coffee table books. Segundo ela, a empresa atende hoje cerca de 3.000 lojistas de móveis e decoração.
“Esteticamente, esses livros são perfeitos. Têm capa dura, de seda… Muitos são até exclusivos”, afirma ela, enfatizando que há tantas opções no mercado que já existem até serviços de curadoria de estante. Alguns designers de interiores e arquitetos oferecem ajuda na escolha de quais e quantos livros comprar para decorar os ambientes. Para isso, levam em conta fatores como paleta de cores, tamanho e estilo do espaço (e do cliente).
No caso de publicações nacionais, os coffee table books costumam custar entre R$ 70 e R$ 600. Já os internacionais variam entre R$ 400 e R$ 15 mil. O valor considera principalmente o nível de beleza e raridade da obra.
Rafa Kalimann e Nattanzinho em vídeos postados pela ex-BBB
Reprodução
Arranjo de livros
Mas nem todos os livros comprados por Rafa Kalimann e Nattanzinho são coffee table books, como eles próprios mostraram nos vídeos. Best-sellers literários como “Salvar Fogo”, do Itamar Vieira Junior, e “Mudar: Método”, de Édouard Louis também estão na pilha.
“Aproveitei para pegar outros livros que eu estava super a fim. Esses aqui são os que eu quero ler de verdade. É para a gente compor a biblioteca lá em cima […] Depois vai ter uma super tour na casa nova”, disse Rafa enquanto mostrava os romances recém-adquiridos.
Não dá para dizer se essas obras serão ou não lidas pelo casal. Mas é fato que muitas pessoas compram livros literários pensando única e exclusivamente em decorar espaços.
Ashley Tisdale mostra livros que comprou para decorar a casa
Reprodução/YouTube/ Architectural Digest
Três anos atrás, por exemplo, a atriz americana Ashley Tisdale (“High School Musical”) foi criticada ao dizer que comprou 400 livros para não deixar sua estante vazia. Rebateu dizendo que “qualquer designer de interiores teria feito o mesmo”.
“Criticar quem compra livro para decoração? Bobagem isso”, diz Maristela Calil, uma das donas da Livraria Calil, que é a mais antiga da capital paulista e vende obras novas e usadas. “Às vezes, vem aquele monte de coleções que, se deixar lá, vai virar palha de papel, e às vezes tem alguém que quer comprar para decorar a prateleira do escritório, da sala, um quarto de infantil, sei lá.”
Compras com fins estéticos não são novidades para Maristela. Há 42 anos à frente da Livraria Calil, ela coleciona histórias assim, inclusive de encomendas por metro e cor. Garante que pedidos desse tipo são bem mais comuns do que se imagina: “Tem todo tipo de cliente”.
“Uma vez, houve um casamento da alta sociedade em que o noivo queria uma estante de livros marrons atrás da mesa do bolo. Aí ele comprou livros por metro. Fiz o arranjo e ainda falei: ‘Você vai poder aproveitar na sua biblioteca’. Não vendi qualquer coisa, selecionei livros para depois, quem sabe, ele ler, que é o que acho mais importante.”
Maristela diz que o design de livros também interessa a quem quer ler. Como o acervo de sua livraria costuma ter mais de uma edição disponível de um mesmo título, é comum que os leitores escolham as versões mais raras e bonitas. “Tem capas ilustradas por Portinari, Tarsila do Amaral… Todo mundo vai atrás dessas.”
Estante de livros de biblioteca municipal de SP
Divulgação / Prefeitura Municipal de São José dos Pinhais
Sem página
Compras com viés estético são tão comuns que existem até livros falsos — objetos que imitam livros, mas, na verdade, são apenas caixas.
No TikTok, aliás, há vários tutoriais que mostram como criar o próprio livro falso. “Trezentos reais em uma caixa para guardar coisa?”, questiona a influenciadora Luciana Meira em um vídeo no qual ensina seus seguidores a economizar com o item. “A gente tem que montar a caixa!”
Outros tiktokers recomendam pintar a capa de um livro para “transformá-lo” em outro título — geralmente para parecer mais caro e adornado do que o original.
Além da decoração, livros têm sido usados como acessórios de moda. É daí que surge um serviço chamado de “book stylist”, alguém que seleciona livros para que celebridades os exibam de forma sutil. A ideia é mostrar que a pessoa é leitora daquela obra, mesmo que ela nunca tenha lido nenhuma linha.
“Sou uma estilista de livros? Não sou. Ou talvez eu seja, não sei. Seria a pior coisa do mundo se eu fosse?”, afirmou a consultora criativa Karah Preiss ao jornal americano “The New York Times” em 2022, ao falar sobre seu trabalho envolvendo livros e celebridades das quais quis manter em anonimato.
“Existe essa ironia de: ‘Essas pessoas estão mesmo lendo livros ou estão apenas tirando fotos com eles?’… Como alguém que adora ler, eu realmente não me importo. A alternativa a fingir que lê livros é simplesmente não os ler e não contar a ninguém sobre eles.”
Em vez de fingimento, Rafa Kalimann e Natanzinho preferem gravar vídeos e chamar aqueles livros de “decorativos”.