Passados alguns dias do anúncio do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de que pretende elevar para 50% as tarifas sobre produtos brasileiros a partir de 1º de agosto, o setor exportador já começou a fazer as contas e a recalcular a rota. Para ajudar nessa hora, o InfoMoney foi ouvir especialistas para saber o que é possível fazer nesses casos.
A orientação de advogados é clara: considere a tarifa como real, ainda que ela possa ser mudada. “Prepare-se como se a tarifa fosse entrar em vigor, mas negocie como se ainda fosse reversível”, aconselha Júlio César Soares, especialista em Direito Tributário e Aduaneiro.
Renata Emery, sócia e co-head da área Tributária do TozziniFreire, diz que o primeiro passo é revisar cláusulas contratuais, especialmente em contratos já firmados anteriormente, para avaliar possibilidades de cancelamento, reequilíbrio econômico ou renegociação.
“Os contratos de exportação normalmente preveem mecanismos para lidar com variações tarifárias. Se a oneração for excessiva, é possível discutir a revisão de preços ou até a rescisão sem multa”, explica ela. A depender da situação, pode-se acionar cláusulas de força maior, usadas quando eventos externos tornam o contrato desequilibrado.
Muito ruído
Apesar do barulho, a medida ainda não é definitiva. Essa não é a primeira vez que o governo americano ameaça taxar o Brasil — a proposta surgiu em abril, foi adiada para 9 de julho e agora, mais uma vez, postergada para agosto, com uma taxa bem mais alta.
O histórico do presidente Trump mostra que esse tipo de anúncio costuma fazer parte de uma estratégia: falar grosso, gerar impacto, abrir espaço para barganha e, se houver recuo do outro lado, reivindicar o crédito da vitória. Enquanto o desfecho não vem, exportadores brasileiros, sobretudo pequenos e médios, sem estrutura para lidar com tarifas internacionais, vivem um cenário de insegurança crescente.
“O maior prejuízo, neste momento, não é tarifário, mas de governança”, explica Soares. Segundo o especilista, o vai e vem de declarações de Trump gera incerteza estratégica, que penaliza especialmente empresas menores, sem departamentos jurídicos ou inteligência tributária internacional. “O cenário desestimula embarques, atrasa planejamento e compromete a competitividade do Brasil em mercados onde previsibilidade é condição básica.”
Pequenos e médios buscam ajuda
Para os pequenos e médios exportadores, a situação é especialmente crítica. Isso fez a procura por suporte jurídico por parte dessas empresas explodir nas últimas semanas. Elias Menegale, do Paschoini Advogados, afirma que muitos estão “desesperados, sem saber como agir”.
Segundo ele, o escritório, que antes recebia um exportador a cada 10 dias, passou a atender de cinco a oito novos casos por semana desde os primeiros anúncios de tarifaços por Trump. A maioria das dúvidas envolve impacto financeiro, validade dos contratos, cláusulas de revisão e busca por alternativas de mercado.
Ele ressalta que empresas menores operam com margens apertadas e não têm reservas financeiras para enfrentar períodos turbulentos. “O papel do advogado nesses casos é acalmar, orientar tecnicamente e ajudar a construir um plano de ação.”
Caos regulatório
Diante do caos regulatório, iniciado desde abril, escritórios especializados em comércio internacional, tributário e aduaneiro já estavam sendo procurados por empresas de todos os portes. “Muitos buscam desde pareceres técnicos até estratégias para renegociar contratos ou redirecionar cargas para outros países”, afirma Fabrício Pasquot, do escritório LO Baptista.
Para Tania Laredo, da Gaia Silva Gaede, mesmo com toda a pressão, o momento é de cautela e planejamento. “Os exportadores devem buscar assessoria jurídica, monitorar diariamente os desdobramentos e, principalmente, entender se haverá viabilidade comercial diante da nova tarifa.”
Motivação política, impacto comercial
Apesar da retórica do governo Trump sugerir que a medida seja uma retaliação por causa da situação do ex-presidente Jair Bolsonaro, os especialistas ouvidos pelo InfoMoney acreditam que as motivações políticas, especialmente com o incômodo com as notícias da última reunião dos países do Brics, encerrada na segunda-feira (7), podem mudar.
“Trata-se de um ato político, não econômico. Por isso, há espaço para diálogo e negociação”, observa Renata Emery. Ela pondera que uma resposta baseada na reciprocidade, com o Brasil também taxando produtos americanos, exigiria cuidado para não prejudicar o próprio abastecimento interno, especialmente em áreas como combustíveis e medicamentos.
Exportar para onde?
Diante da perspectiva de tarifas mais altas, os advogados recomendam que as empresas brasileiras comecem a diversificar mercados e buscar acordos mais estáveis. “O mais pragmático, neste momento, é buscar outros compradores”, diz Emery.
Segundo dados de comércio exterior, o Brasil já enfrentava uma tarifa média de 10% nas exportações para os Estados Unidos. Com o aumento para 50%, a alíquota saltaria para 60%, colocando os produtos brasileiros em grande desvantagem competitiva frente a fornecedores de países como México, Canadá e África do Sul.
“Este é um daqueles momentos em que os empresários precisam se preparar para o pior, mas manter a estratégia voltada para o melhor cenário possível”, resume Morvan Meirelles Costa Junior, do Meirelles Costa Advogados. “A resiliência e a capacidade de adaptação serão os maiores ativos do exportador brasileiro.”
Andrey Lyncon, advogado no escritório Schiefler Advocacia, concorda e aconselha aos empresários que evitem decisões precipitadas. “A experiência mostra que anúncios tarifários como esse costumam fazer parte de uma estratégia de pressão política, e podem ser revistos antes de sua efetiva aplicação.”
Taxa insustentável
Especialista em vistos americanos e imigração aos Estados Unidos, Guilherme Vieira, CEO da On Set Consultoria Internacional, acredita que essa nova taxação seja insustentável para os dois lados e recomenda cautela. “Esse tipo de medida prejudica não só o Brasil, mas também os Estados Unidos.”
Segundo Vieira, essa é uma jogada clássica de negociação no estilo Trump: ele eleva o tom, impõe pressão máxima, e abre espaço pra que a outra parte venha à mesa, negocie, e aceite fazer concessões. “A data marcada para começar a taxação é só 1º de agosto de 2025 por isso, mostrando que a intenção real é negociar antes.”
Ele também recomenda que exportadores avaliem a possibilidade de abrir uma filial ou sede em solo norte-americano. “Cada vez mais exportadores estão montando estrutura lá para ter uma base e facilitar os negócios diretos, reduzindo o impacto de tarifas, melhorando a confiança do cliente, e trazendo mais segurança jurídica. Além disso, os Estados Unidos ainda têm muitos incentivos a empresas que se instalam lá, como consequência da política America First, que continua forte.”
Apesar de reconhecer que a realocação parcial ou total de processos de fabricação para dentro dos Estados Unidos pode ser uma saída – especialmente por meio de parcerias estratégicas com empresas locais, terceirizações ou até joint ventures – o advogado tributarista Leonardo Roesler acredita que tal reposicionamento exige investimentos vultosos, bem como uma estruturação societária e tributária sofisticada. “Tais fatores podem excluir os pequenos e médios produtores da possibilidade imediata de se adaptarem por essa via. Mas diante de tantas incertezas é fundamental começar a redesenhar sua operação para aumentar a resiliências a dificiuldades como essas”, disse.
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