Em um movimento conjunto no início da semana, General Motors, Stellantis (Citroën, Fiat, Jeep, Peugeot e Ram), Toyota e Volkswagen enviaram uma carta oficial ao Governo Federal alertando sobre a possível aprovação de redução de alíquotas para a montagem de veículos em solo nacional.
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A carta é uma resposta das marcas ao pedido de redução de alíquotas da BYD, que iniciou recentemente a montagem de carros em sua fábrica em Camaçari (BA) em caráter experimental.
Inicialmente, a chinesa utilizará o processo Semi Knocked Down (SKD), que consiste apenas na montagem de veículos que vem parcialmente prontos do exterior. A marca também terá no futuroo sistema Completely Knock-Down (CKD), para a “produção” completa dos kits de veículos, que também já vem prontos de fora do Brasil. Por isso o interesse na redução.
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Porém, isso descontentou diretamente as fabricantes nacionais. Enviada diretamente para o presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, a carta pedindo atenção sobre o projeto foi assinada por todas as fabricantes citadas. Em um dos trechos, as empresas levantam a questão de que, desde 1950, o setor tem sido um vetor de muita importância para o desenvolvimento das indústrias.
Há também o levantamento do faturamento anual que o setor gera, algo em torno de US$ 74,7 bilhões, que representa 2,5% do PIB brasileiro.
A carta das montadoras
“É nosso dever alertar, Senhor Presidente, que esse ciclo virtuoso de fortalecimento da indústria nacional está sendo colocado em risco e sofrerá forte abalo se for aprovado o incentivo à importação de veículos desmontados para serem acabados no país.
Ao contrário do que querem fazer crer, a importação de conjuntos de partes e peças não será uma etapa de transição para um novo modelo de industrialização, mas representará um padrão operacional que que tenderá a se consolidar e prevalecer, reduzindo a abrangência do processo produtivo nacional e, consequentemente, o valor agregado e o nível’e geração de empregos.
Por uma questão de isonomia e busca de competitividade, essa prática deletéria pode disseminar-se em toda a indústria, afetando diretamente a demanda de autopeças e de mão de obra. Seria uma forte involução, que em nada contribuiria para o nível tecnológico de nossa indústria, para a inovação ou para a engenharia nacional. Representaria, na verdade, um legado de desemprego, desequilíbrio da balança comercial e dependência tecnológica”
Nos próximos anos, as empresas têm mais de R$ 180 bilhões investidos no setor automotivo brasileiro, separados entre desenvolvimento de produtos e parque de autopeças.
Para as fabricantes, um possível incentivo fiscal para os processos SKD e CKD, que serão utilizados inicialmente por marcas chinesas atuantes no Brasil, atrapalha o desenvolvimento industrial brasileiro, além de criar uma “competição desleal” para com elas.
BYD responde a carta das fabricantes nacionais
Dois dias após o envio da carta da Stellantis, GM, VW e Toyota, a BYD replicou com uma nota pública, questionando as ações da Anfavea e criticando a postura das marcas.
A fabricante chinesa afirma que as empresas estão “implorando” para o governo brasileiro não reduzir as tarifas para quem “ousa oferecer carros melhores por um preço mais justo”. Também questiona o fato das reduções dos preços dos veículos, que aconteceram somente após sua chegada e da GWM, em meados de 2023.
Confira alguns trechos da carta publicada pela BYD.
“A carta fala em “concorrência desleal”. Porque nada é mais desleal do que alguém jogar o jogo — e ganhar. Nada mais injusto do que montar um carro no Brasil sob o regime autorizado pelo governo, com data marcada para nacionalizar a produção, e ainda assim entregar um produto que as “locais” não conseguem nem sonhar em oferecer.
A reação da Anfavea e seus associados, infelizmente, não é novidade. Trata-se do velho roteiro de sempre: diante de qualquer sinal de abertura de mercado ou inovação, surgem as ameaças de demissões em massa, fechamento de fábricas e o fim do mundo como conhecemos. É uma espécie de chantagem emocional com verniz corporativo, repetida há décadas pelos barões da indústria para proteger um modelo de negócio que deixou o consumidor brasileiro como último da fila da modernidade.
A redução temporária de imposto que a BYD pleiteia segue uma lógica simples e razoável: não faz sentido aplicar o mesmo nível de tributação sobre veículos 100% prontos trazidos do exterior e sobre veículos que são montados no Brasil, com geração de empregos locais, movimentação da cadeia logística e pagamento de encargos. Isso não é nenhuma novidade, outras montadoras já adotaram a mesma prática antes de ter a produção completa local.
O incômodo das concorrentes não tem a ver com impostos, nem com montagem, nem com empregos. Tem a ver com a perda de protagonismo. Com o fato de que um novo player chegou oferecendo mais e cobrando menos. Com o fato de que a tecnologia finalmente deixou de ser um luxo para poucos e virou realidade para muitos.”
Qual alíquota a BYD quer reduzir?
O assunto não é tão atual. Em fevereiro deste ano, a BYD enviou a solicitação de redução à Câmara de Comércio Exterior (Camex), mas a reunião extraordinária para discussão do tema está marcada para hoje (30), em conjunto com o Comitê Executivo de Gestão (Gecex).
O objetivo da BYD é fixar as alíquotas em 10% para a montagem SKD e 5% para CKD até 30 de junho de 2028, além de incluir picapes nas reduções, que atualmente não são contempladas.
No sistema atual, os valores são cobrados de acordo com a tecnologia do veículo e há um agravante: em julho de 2028 as alíquotas serão fixadas em 35% em todos os casos. Confira as alíquotas atuais para os veículos.
- SKD: 20% para híbridos plug-in e 18% para elétricos
- CKD: 7% para híbridos plug-in e 5% para elétricos
Essa alteração poderia favorecer não somente a BYD, mas também outras fabricantes chinesas que já atuam no Brasil. A GWM, por exemplo, começará em breve a montar kits CKD de seus carros na fábrica de Iracemápolis, no interior de SP.
Descontentamento recorrente
Não é nenhuma novidade o descontentamento das ditas fabricantes tradicionais com os incentivos fiscais dados pelo governo para importação de veículos eletrificados.
A Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) já sugeriu algumas vezes o aumento da alíquota de imposto de importação de carros chineses em 35%. O órgão alega que só assim será possível “proteger a indústria nacional”. O governo, no entanto, adotou uma postura diferente, realizando aumentos graduais até chegar a 35% em julho de 2026.
O primeiro reajuste aconteceu no dia 1º deste mês. As alíquotas passaram a ser de 25% para elétricos, 28% para híbridos plug-in e 30% para híbridos convencionais. Antes, elas eram fixadas em 18%, 20% e 25%, respectivamente.
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