Em um momento marcado por incertezas políticas e econômicas, tanto dentro do país quanto fora dele, Daniel Pegorini, CEO da Valora Investimentos, enxerga mais oportunidades do que ameaças para o investidor brasileiro.
Para ele, o cenário atual – que inclui o impacto de medidas como a tarifação proposta por Donald Trump nos EUA, por exemplo – é desafiador, sim, mas bem menos crítico do que momentos anteriores vividos pelo Brasil. “Sempre vai existir ruído, mas o investidor precisa olhar o todo, com horizonte de longo prazo”, afirma.
Com quase 20 anos de história e R$ 21,5 bilhões sob gestão, a Valora se especializou em crédito estruturado e vê grande potencial de crescimento em áreas como infraestrutura, agro e FIDCs. A gestora aposta que esses segmentos seguirão ganhando representatividade no mercado de capitais brasileiro, hoje ainda muito concentrado em poucos setores, aponta Pegorini.
Na Premiação Outliers InfoMoney, que reconheceu os melhores do mercado em 16 categorias, a Valora foi destaque em três: levou o primeiro lugar entre os melhores fundos de Fiagro e entre os melhores fundos de fundos (FOF), além do segundo lugar entre os melhores FII de papel.
Segundo o executivo, a performance reflete a capacidade da casa em navegar ciclos complexos do mercado. “No agro, conseguimos evitar nomes com risco de crédito e atuar em nichos com maior previsibilidade. Já no imobiliário, a flexibilidade do VGHF11 nos permite mudar a estratégia conforme o ciclo”, explica Pegorini.
Ele conta ainda que o reconhecimento também serviu como termômetro interno. “Tivemos outros fundos indicados que não venceram, e isso nos fez olhar onde ainda podemos melhorar. A premiação ajuda o mercado a evoluir”, afirma o CEO.
Para os próximos anos, a gestora aposta na força de seu modelo de partnership, em que os sócios lideram áreas estratégicas, e em uma governança sólida, com decisões tomadas por comitês de investimento.
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Confira abaixo a entrevista com Daniel Pegorini, CEO da Valora Investimentos:
InfoMoney: Para começar, eu vou pedir para você contar um pouco sobre a trajetória da gestora e em quais verticais vocês atuam, para quem ainda não conhece a Valora.
Daniel Pegorini: A Valora Investimentos começou em 2005, portanto completamos 20 anos esse ano. Eu sou um dos sócios fundadores e CEO desde o início. Sempre fomos bastante focados em crédito estruturado, em crédito alternativo estruturado. Nossos primeiros fundos já tinham essa imagem. Por exemplo, o Valora Guardian foi um dos 20 primeiros fundos na plataforma da XP, e é um fundo de FDIC (Fundo de investimento em direitos creditórios). Sempre tivemos essa pegada de fundos de crédito e crédito estruturado.
Com o tempo, fomos criando diferentes especialidades. Depois dos fundos de crédito em plataforma aberta, veio a parte imobiliária, que está com a gente há quase 10 anos. Foi nesse contexto que criamos os fundos VGIR11 e VGHF11, que foram destaques na premiação. O VGIR11 foi nosso primeiro fundo listado na B3. Ele começou logo depois da greve dos caminhoneiros, então enfrentou eventos relevantes no início. Hoje tem R$ 1,5 bilhão de patrimônio e liquidez diária que chega a R$ 6 ou 7 milhões.
Depois veio o VGHF11, o primeiro hedge fund imobiliário do Brasil. Ele consegue navegar bem cada ciclo do mercado imobiliário, porque pode investir em CRIs, FDICs imobiliários, ações da B3, SPs, incorporadoras, etc.
Também criamos a área agro em 2019. Logo depois veio a regulamentação dos Fiagros, e criamos o VGI11, um dos primeiros fundos agro do Brasil, que investe em CRAs indexados ao CDI. Isso era algo incomum na época, e conseguimos adaptar o mercado a esse formato.
Atualmente, temos R$ 21,5 bilhões sob gestão. Também temos uma área de infraestrutura, com fundos listados e setipados, além de uma área de gestão de FDICs. Somos especializados em ativos estruturados de crédito.
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IM: Em uma entrevista anterior aqui no InfoMoney, no fim de abril, vocês tinham acabado de atingir R$ 19 bilhões sob gestão. Já estão quase em R$ 22 bilhões agora. Quais são os próximos passos da Valora para continuar crescendo?
DP: Nós não somos muito de falar sobre o que ainda não fizemos. Sempre trabalhamos com a lógica de que há muito espaço para crescer nas verticais em que atuamos. Infraestrutura, por exemplo, está apenas começando no Brasil — tem muito espaço. O agro também. Representa entre 25% e 27% do PIB brasileiro, mas não tem essa mesma representatividade no mercado de capitais. Acreditamos que isso vai mudar nos próximos anos, com crescimento acima da média em comparação com outras áreas.
Mesmo o mercado imobiliário, que cresceu bastante nos últimos anos, ainda é pequeno quando comparado ao tamanho total do mercado e à atividade bancária nesse setor. Os FDICs, por exemplo, atingiram mais de R$ 600 bilhões de patrimônio líquido na indústria. Muita gente acha que já cresceu demais, mas acreditamos que pode mais do que dobrar de tamanho. São veículos muito flexíveis, que podem contribuir muito na estrutura de capital dos negócios via mercado de capitais. Estamos bem posicionados para crescer substancialmente nessas áreas nos próximos anos.
IM: Você falou de crescimento futuro, então queria saber: mesmo com esse cenário atual mais instável — política, economia, guerras e tarifas do Trump — dentro e fora do país, quais são as oportunidades que vocês enxergam para o investidor nesse ambiente desafiador?
DP: Verdade, estamos em um momento turbulento, mas é importante colocar isso em perspectiva. Estou há 30 anos no mercado financeiro. Vi o nascimento do Plano Real, vivi a dinâmica da hiperinflação — eu ganhava mesada na segunda e na outra segunda não dava mais para comprar o mesmo hambúrguer. Então, acho que esse momento precisa ser analisado com calma.
Sim, temos distúrbios globais, como a nova lógica tarifária do Trump [a entrevista foi gravada antes do anúncio da nova tarifa de 50% aplicada ao Brasil]. Mas nada está completamente fora de controle. O ‘10 anos americano’ [título de dívida emitido pelo governo dos EUA com vencimento em 10 anos], que é considerado o único ativo de verdade do mundo, já esteve em situações bem piores do que agora. A economia americana está respondendo, é rica e muito grande.
No Brasil, vejo mais um problema político do que econômico. Perto de outros momentos que já vivemos, a situação está razoável. Se apresentarmos um plano fiscal minimamente razoável, a inflação já está cedendo, segundo o Boletim Focus. O PIB não está estagnado nem em queda. O câmbio saiu de perto de R$ 6,30 para R$ 5,40, o que ajuda a inflação. Às vezes, a gente até dá sorte, como agora com o enfraquecimento do dólar globalmente. Não estou dizendo que está tudo certo, mas não estamos numa situação crítica como em outras épocas, como no impeachment da Dilma.
As instituições estão funcionando — Banco Central, Congresso — fazendo os devidos “checks and balances”. Então, ainda não cruzamos uma linha de não retorno. Temos boas coisas para perseguir no curto prazo.
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IM: E a questão da tributação no Brasil, como a tentativa de elevar o IOF sobre algumas categorias de investimento, que gerou um imbróglio entre governo e Congresso e foi parar no STF? Como o investidor pode driblar essa instabilidade? Quais caminhos vocês enxergam?
DP: Isso é um desafio, mas o investidor deveria tentar tirar o ruído da situação. Muitas vezes, ficamos presos a notícias diárias e não olhamos o todo com uma visão mais ampla e de longo prazo. Esse tipo de coisa já aconteceu diversas vezes: tributação de dividendos, de fundos isentos, e por aí vai. Não estou dizendo que não possa acontecer, mas essa medida provisória atual, por exemplo, diz que o que está para trás não será tributado. Isso já é um avanço.
A recomendação é: não fazer movimentos bruscos com base em manchetes. Muitas vezes, é mais ruído do que informação estrutural. O investidor entra no calor do momento e pode acabar tendo prejuízo. É como trocar de faixa o tempo todo na marginal e acabar atrás do caminhão que estava na sua frente.
O ideal é ter uma lógica de longo prazo. Não olhar para horizontes de uma semana ou um mês, mas sim de um ano. Hoje somos sobrecarregados por informações de curto prazo, que atrapalham mais do que ajudam. Às vezes, medidas nem se concretizam. No final do ano passado, por exemplo, muitos venderam fundos listados com pressa e perderam dinheiro. O fundo estava subavaliado, e bastava ter esperado.
Sempre falo: ninguém compra um apartamento por R$ 1 milhão e vende por R$ 750 mil dois meses depois. Por que o investidor faz isso com fundo imobiliário? É fácil apertar um botão e sair, mas ele deveria agir com mais paciência, com horizonte de fundos imobiliários, agro, infraestrutura.
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IM: Falando agora da participação da Valora na premiação Outliers InfoMoney, a gestora levou o primeiro lugar na categoria melhor fundo de Fiagro, com o fundo VGIA11. Como vocês avaliam esse mercado e qual o diferencial do fundo?
DP: No início, criamos uma área agro para originar operações para nossos fundos abertos de crédito. Com a chegada dos Fiagros, transformamos isso numa vertical especializada, com o VGI11 como carro-chefe. A gente fez uma leitura de que o ideal seria atuar no meio do caminho — nem muito focado nos produtores rurais, nem nas tradings — mas sim nas distribuidoras, cooperativas, etc.
O fundo teve um problema de crédito em 2022, mas conseguimos resolver porque as operações tinham muitas garantias. Isso mostra a importância da nossa abordagem securitizada. Pegamos recebíveis e ativos reais como garantia, o que nos permite acionar colaterais se houver inadimplência. Fugimos de nomes que depois tiveram problemas — já tínhamos identificado os riscos. O agro é cíclico, e nossa equipe entende muito do setor. O Guilherme Grahl e o Humberto Hartman, que tocam essa área, têm passagens pelo Citi e pela Cargill, respectivamente. Isso fez muita diferença.
A expectativa é muito positiva para o segundo semestre. O produtor rural já resolveu a vida, tivemos safra recorde. Com a base da cadeia funcionando, os efeitos positivos se propagam.
IM: A Valora também levou o primeiro lugar na categoria melhor fundo de fundos, com o fundo VGHF11. Qual é o diferencial dele e como é feita a alocação de recursos?
DP: O VGHF11 é o primeiro hedge fund imobiliário do Brasil. Outras casas seguiram o mesmo caminho depois. Esses fundos substituíram os antigos FOFs. A grande vantagem é a flexibilidade: ele pode investir em CRIs, fundos imobiliários, ações, entre outros. Em momentos de crise, como em dezembro passado, um veículo como esse acaba se beneficiando porque consegue comprar ativos com muito valor e depois consegue sair dessa carteira conforme o mercado volta ao valor de fato que deveriam estar.
Essa estratégia é liderada pelo Vedrossi e pelo Varandas, nossos sócios da área imobiliária. Eles criaram um fundo capaz de navegar cada ciclo do mercado imobiliário, que é muito cíclico, principalmente no Brasil, com todas essas movimentações da Selic. Em um momento, financiamos imóveis prontos; em outro, construção. O VGHF11 se adapta a isso com eficiência. O investidor comum não consegue fazer esse movimento com antecedência — muitas vezes percebe a mudança de ciclo quando ela já passou. Nós conseguimos ver com uma certa antecedência em que ponto do ciclo estamos e a partir daí estabelecer uma estratégia de composição de carteira que melhor navegue esse ciclo.
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IM: Por fim, a Valora se destacou na premiação com um terceiro fundo, o VGR11, que ficou em segundo lugar como melhor FII de papel. Qual é a estratégia utilizada aqui? É similar ou diferente da estratégia de alocação dos dois fundos anteriores?
DP: O VGR11 é um fundo de CRIs indexados ao CDI no setor imobiliário. Ele é, por assim dizer, o “VGI11 do mercado imobiliário”. Ambos têm estratégias semelhantes em seus respectivos setores. Foi o nosso primeiro fundo listado e surgiu da nossa crença no crédito imobiliário.
Na Valora, optamos por separar estratégias: temos um fundo puro em CDI e outro puro em inflação (o VGIP11). O CRI em CDI traz menor volatilidade e marcação a mercado, que traz menor volatilidade ao investidor. Não somos investidores de first tier, não emprestamos para empresas como a Cyrela, por exemplo. Atuamos no second tier, com taxas melhores — entre CDI + 3% e CDI + 6%. O fundo tem alta pulverização de ativos e baixa concentração de risco. Em quase oito anos, ele entrega uma experiência consistente de CDI + 3% desde o início.
IM: Para encerrar: quais são as boas práticas de governança adotadas pela Valora? O que você destacaria como diferencial?
DP: Temos várias. Primeiro, a Valora é uma partnership. Todos os líderes das áreas são sócios da gestora como um todo, não de áreas específicas. Isso evita objetivos individuais e garante alinhamento. Em segundo lugar, temos pessoas muito qualificadas liderando os negócios. O [Alessandro] Vedrossi e o [José Eduardo] Varandas, por exemplo, vêm do mercado imobiliário, com experiência prática. O Guilherme Grahl já visitou todas as regiões agrícolas do Brasil este ano — é literalmente “pé no barro”.
Também temos comitês de investimento: ninguém compra ativos sozinho. Todas as decisões são unânimes. Como diz o provérbio africano: “Se quiser ir rápido, vá sozinho. Se quiser ir longe, vá em grupo.” É um pouco da nossa lógica aqui. Além disso, originamos ativos proprietários — o que carinhosamente apelidamos de “levar o investidor para tomar água limpa fora da Faria Lima — em operações feitas sob medida para nossos fundos. E não temos conflitos de interesse. Somos remunerados por taxa de administração e performance, sempre alinhados ao único cliente que importa: o investidor do fundo.
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